Antes do começo das discussões formais sobre o projeto de lei complementar que trata do novo arcabouço fiscal (PLP 93/2023) no Senado Federal, 31 emendas já foram apresentadas por parlamentares que integram a Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) da casa legislativa para modificar a versão do texto encaminhada pela Câmara dos Deputados.
Entre os principais alvos dos senadores membros do colegiado estão os dispositivos que incluíram as complementações da União ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) e o Fundo Constitucional do Distrito Federal (FCDF) na regra de limitação de despesas.
Também são objeto de sugestões de modificação os “gatilhos” que seriam acionados em caso de descumprimento do limite inferior da meta de resultado primário estabelecida para determinado exercício e exceções que podem permitir um incremento de despesas em 2024. Nas duas situações, no entanto, o intuito de senadores seria tornar a regra mais rígida.
Veja a lista completa dos dispositivos ao final desta reportagem.
O projeto de lei complementar chegou ao Senado Federal há exatamente duas semanas, depois que concluiu sua tramitação na Câmara dos Deputados. Na casa revisora, o texto deverá tramitar em apenas uma comissão de mérito – a CAE, sob a relatoria do senador Omar Aziz (PSD-AM) – e seguir para deliberação em plenário.
Caso o texto não sofra alterações de mérito em relação à versão votada pelos deputados, ele segue para a sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Mas se eventuais mudanças não se restrinjam a ajustes redacionais, será necessária uma nova avaliação da Câmara, que tem a palavra final sobre o projeto e decidirá se acata ou não o novo texto.
Na avaliação de analistas políticos consultados pelo InfoMoney na 45ª edição do Barômetro do Poder, a tendência é que os senadores não imponham mudanças expressivas no projeto. Para 85% dos especialistas que participaram do levantamento, o texto deve sair da casa legislativa sem mudanças de mérito. Outros 15% esperam uma versão mais branda em termos fiscais e/ou de “enforcement” (ou seja, de mecanismos de garantia de cumprimento).
Até a tarde desta quarta-feira (7), 8 senadores de partidos de oposição e independentes haviam protocolado emendas ao projeto de lei complementar na Comissão de Assuntos Econômicos. Ninguém da base governista propôs alterações, em um esforço para evitar um alongamento na tramitação da proposição no parlamento.
Os opositores Ciro Nogueira (PP-PI) e Tereza Cristina (PP-MS) foram os que apresentaram mais sugestões: 7 cada um. Ambos foram ministros do governo de Jair Bolsonaro (PL) – o primeiro da Casa Civil e a segunda, da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.
Na sequência, aparece Rogério Marinho (PL-RN), outro ex-ministro da gestão anterior e que hoje lidera a oposição no Senado Federal. Ele protocolou 5 emendas ao projeto – mesmo número que Plínio Valério (PSDB-AM).
Já a senadora Professora Dorinha Seabra (União Brasil-TO) registrou 3 emendas – uma a mais que Damares Alves (Republicanos-DF), ex-ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. O senador Alessandro Vieira (PSDB-SE) protocolou 1 emenda.
Fonte: Senado Federal | Elaboração: InfoMoney
Há uma expectativa no Senado Federal de que o texto seja apreciado em plenário ainda neste mês e não enfrente dificuldades para avançar. O relator do projeto, senador Omar Aziz, tem dito que espera votar a matéria entre os dias 20 e 21 de junho.
Em entrevista à CNN Brasil, ele afirmou que não quer “protelar” a tramitação do texto e que conversará com o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), e o relator da matéria na casa legislativa, Cláudio Cajado (PP-BA), caso ajustes obriguem uma nova votação.
Sem indicar a posição que adotará sobre a inclusão do Fundeb no limite de despesas, Aziz se limitou a dizer que “de forma alguma” o Congresso Nacional prejudicará a Educação. “Não tenha dúvida de que o Fundeb não será prejudicado, e será analisado de forma que sejam ouvidas todas as pessoas”, afirmou.
Possíveis mudanças
Há pelo menos 4 emendas protocoladas na Comissão de Assuntos Econômicos que buscam retirar do limite de despesas imposto pelo projeto de lei complementar os valores referentes à complementação da União ao Fundeb.
São defensores desta bandeira os senadores Professora Dorinha Seabra (União Brasil-TO), Plínio Valério (PSDB-AM) e Alessandro Vieira (PSDB-SE). Os textos que tratam desta mudança são similares, mas merece destaque a emenda nº 3, da primeira parlamentar, que também busca retirar do “teto” o mínimo constitucional destinado à Educação (valor calculado a partir de 18% da receita resultante de impostos).
“Incluí-las, vinculações e complementação, sob o teto é, na prática, uma forma de trazer a trava das despesas não vinculadas constitucionalmente mais para baixo a cada ano de crescimento, até que essa trava se torne negativa”, argumenta Dorinha.
“Num primeiro momento, isso pode parecer não tão problemático, porque isso só se dá num ambiente de crescimento, no qual todas as despesas poderão crescer, ainda que em margem menor. No entanto, em longo prazo, essa diferença a mais em que crescem as vinculações e a complementação reduzirá cada vez mais essa margem de crescimento das outras despesas, até se tornarem cortes”, prossegue.
A parlamentar também é autora de emenda que defende a exclusão dos limites impostos pelo novo marco fiscal de despesas relativas a transferências aos fundos de Saúde dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, na forma de assistência financeira complementar para cumprimento dos pisos nacionais salariais para o enfermeiro, o técnico de enfermagem, o auxiliar de enfermagem e a parteira.
Outro ponto muito defendido pelos parlamentares é a manutenção da regra antiga para o ajuste do Fundo Constitucional do Distrito Federal (FCDF) – o que na prática significa a exclusão deste item do rol de despesas sujeitas ao limite previsto no projeto de lei complementar.
Neste caso, as emendas pedem a supressão do art. 14 do projeto. Isso significa que, caso não seja incorporado pelo relator, mas levado a votação através de destaque no plenário da casa legislativa, obrigarão os defensores da versão original a construírem maioria para derrubar o dispositivo e manter o texto que veio da Câmara dos Deputados.
Foram identificadas 3 emendas nesse sentido, de autoria dos senadores Eduardo Gomes (PL-TO), Plínio Valério (PSDB-AM) e Damares Alves (Republicanos-DF).
“O FCDF é responsável pelo custeio integral da segurança pública da Capital da República, sede dos Três Poderes e de representações diplomáticas de dezenas de países, além de auxiliar em áreas sensíveis como educação e saúde no Distrito Federal. A retirada de recursos do Fundo corrói a autonomia e a capacidade do governo do Distrito Federal de atender às necessidades de sua população, com consequências prejudiciais em todos os aspectos da vida cotidiana da população”, alerta Plínio Valério.
Já a senadora Damares Alves alega que houve equívoco nas simulações consideradas pelos deputados e que não houve debate suficientemente aprofundado sobre o assunto, apesar de sua inclusão ao projeto durante a tramitação da matéria.
“O Governo do Distrito Federal utilizou, para fins de cálculo de variação média anual, toda a série histórica de variação do FCDF, obtendo 10,71% de crescimento médio anual. Alterando a forma de correção do FCDF, como pretende o projeto aprovado na Câmara dos Deputados, o prejuízo ao Distrito Federal seria de R$ 87,8 bilhões nos próximos 10 anos”, pontua.
“A Câmara dos Deputados, por sua vez, para fins de cálculo de variação média anual utilizou apenas o período entre 2012 a 2022, obtendo 5,9 % de crescimento anual. Ato contínuo, fez uma projeção em relação à diferença de valores finais (e não perda acumulada) no ano de 2030, obtendo uma redução de valor final de R$ 278 milhões, ou seja, aproximadamente 1 % do FCDF atual.”, continua.
“Como se observa, a Câmara dos Deputados firmou entendimento, por equívoco, de que as perdas em 2030 seriam de 1%, o que não justificaria qualquer mudança na lei atual”, conclui.
Senadores do Distrito Federal acreditam que conseguirão retirar o dispositivo do texto durante as discussões na casa legislativa. Os senadores Izalci Lucas (PSDB-DF) e Leila Barros (PDT-DF) trataram do assunto em reunião realizada ontem (6) com o presidente do Senado Federal, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), com o governador Ibaneis Rocha (MDB-DF), e com outros 7 ex-governadores do DF.
“Não tenho dúvida de que o Senado é favorável ao Distrito Federal. Os senadores estão nos ajudando muito. Acho que a grande maioria entendeu e vai nos ajudar a retirar isso do texto”, disse Izalci após o encontro – que ele classificou como “histórico”.
O parlamentar acrescentou que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) teria se comprometido a vetar o trecho caso ele venha a ser mantido no texto da lei. Ele destacou que a mudança sobre o Fundo Constitucional não veio no texto original do Palácio do Planalto.
Outro ponto muito atacado pelos senadores são “exceções” criadas pelo projeto de lei complementar que podem implicar em aumento mais generoso de despesas para o governo em 2024, seja por um diferencial entre a inflação projetada e a verificada, seja por uma arrecadação acima do esperado. Ao menos 7 emendas tratam destes dispositivos previstos no texto aprovado pelos deputados.
“Considerando que o objetivo do regime fiscal sustentável é assegurar uma trajetória sustentável da dívida pública, não nos parece razoável ter uma regra extra para 2024, com expansões adicionais aos limites da despesa, além daquelas já definidas pela correção da inflação e pelo crescimento real da arrecadação”, pontua o senador Ciro Nogueira na justificação de uma das emendas.
“Dada essa forte expansão dos gastos em 2023, que representa a base para a expansão das despesas nos próximos anos, com impactos na trajetória de endividamento público, somos contrários à possibilidade de uma expansão adicional dos gastos em 2024. Temos que lembrar que um crescimento adicional do limite das despesas vai requerer aumento da carga tributária ou do endividamento público, com impactos negativos no crescimento econômico e no bem-estar das nossas gerações futuras”, adiciona a senadora Tereza Cristina.
O líder da oposição no Senado Federal, Rogério Marinho, defende que o novo arcabouço fiscal desconsidere de sua base de cálculo as despesas aprovadas pelo Congresso Nacional na chamada PEC da Transição, que somaram R$ 250 bilhões para viabilizar políticas defendidas por Lula em seu primeiro ano de mandato.
Em uma de suas emendas, o parlamentar defende que seja adicionado à base de cálculo do limite de despesas previsto no projeto um montante de R$ 120 bilhões, que acomodaria pagamentos relativos ao novo Bolsa Família (R$ 70 bilhões) e o que ele chamou de “outros compromissos discricionários do Poder Executivo” (R$ 50 bilhões). Ele estima que a mudança geraria uma economia de R$ 500 bilhões aos cofres públicos em 4 anos.
Um quarto pilar sugerido por senadores envolve mudanças no “enforcement” e nos “gatilhos” previstos no projeto de lei em caso de descumprimento da meta de resultado primário estabelecida pelo próprio governo de turno. No primeiro caso, há iniciativas que buscam restabelecer a possibilidade de punição do gestor público em eventual fracasso na busca dos objetivos.
Já no segundo, há dispositivos que buscam endurecer as regras. A senadora Tereza Cristina é autora de uma emenda que libera o acionamento de “gatilhos” para impedir a criação de despesas públicas caso o governo não cumpra o centro da meta de resultado primário – ainda que se mantenha na banda de tolerância. E Ciro Nogueira defende que todos os “gatilhos” previstos sejam liberados no primeiro ano em que os objetivos não forem alcançados pelo Poder Executivo.
Veja um resumo de cada emenda apresentada ao projeto pelos senadores:
Fonte: Senado Federal | Elaboração: InfoMoney
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