A inquietação dos investidores em relação a um ambiente cada vez mais incerto aumentou depois do inesperado corte de juros na Noruega nesta quinta-feira (19), ressaltando como as sobretaxas de importação dos Estados Unidos, a guerra no Oriente Médio e um dólar instável tornam a política monetária global e a inflação ainda mais difíceis de prever.
A coroa norueguesa caiu cerca de 1% em relação ao dólar e ao euro em um sinal de como a medida foi inesperada. E a Suíça, que reduziu os juros para 0% nesta quinta-feira, frustrou algumas expectativas de investidores sobre um retorno a taxas negativas no país atingido por deflação.
Apenas um dia antes, o Federal Reserve manteve os juros nos EUA e o presidente da autoridade monetária norte-americana, Jerome Powell, disse que “ninguém” tem convicção sobre a trajetória das taxas à frente.
A conclusão para os mercados: a incerteza sobre a política monetária é mais um obstáculo a ser enfrentado em um cenário de riscos geopolíticos e comerciais.
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Com isso, bolsas de valores globais se distanciaram de picos recentes, o indicador da volatilidade do mercado acionário europeu atingiu a maior alta em dois meses e houve venda de títulos de governo, geralmente tidos como portos seguros ante risco geopolíticos.
“Estamos em um momento de considerável incerteza política e macroeconômica”, disse o diretor de investimentos da BlueBay na RBC Global Asset Management, Mark Dowding. “Não podemos ver uma tendência clara em relação às taxas de juros”, acrescentou ele, que está evitando apostas ativas no mercado em todos os portfólios de investimento do grupo.
Segundo alguns investidores, a volatilidade deve aumentar, pois um dólar instável e os preços do petróleo afetados pela geopolítica significam que os bancos centrais têm muito menos condições de fornecer aos mercados e aos investidores um roteiro claro para o futuro.
“Não é mais possível seguir as dicas dos bancos centrais, pois eles estão enfrentando uma tarefa mais difícil de ler a economia por conta própria”, disse Davide Oneglia, diretor de macroeconomia europeia e global do T.S. Lombard.
Modelos quebrados dos bancos centrais
Os bancos centrais europeus que reduzem juros não estão apenas divergindo do Fed, que está enfrentando os riscos inflacionários gerado pelas sobretaxas de importação do presidente Donald Trump.
Eles também estão lutando para navegar em uma nova era em que o dólar, o eixo do comércio mundial, os preços das commodities e as avaliações de ativos, tornaram-se mais fracos e mais voláteis sob o estresse da guerra comercial e a ansiedade gerada por dívida governamental.
“Essa é uma mudança fundamental enorme nos mercados globais que todos estão tentando avaliar”, disse Nick Rees, chefe de pesquisa macro da Monex Europe. “Todas as regras econômicas padrão que usamos para fazer previsões estão completamente quebradas neste momento.”
O dólar caiu quase 9% em relação a outras moedas importantes este ano, mas subiu após a eclosão da guerra entre Israel e Irã.
O formulador de políticas do Banco Central Europeu, François Villeroy de Galhau, disse nesta quinta-feira que o BCE poderia ter que adaptar seus planos de corte de taxas se a volatilidade dos preços do petróleo for duradoura.
O novo status quo dos mercados pode muito bem ser uma era de surpresas para os bancos centrais que criam mudanças rápidas na narrativa do mercado, nos preços dos ativos e nas tendências de volatilidade, disseram analistas.
“Estamos entrando no próximo ciclo em que as variáveis são muito mais voláteis, porque, em vez de (a política monetária) ser facilmente previsível, os eventos assumem o controle e os fatores políticos e humanos, como sabemos agora com Donald Trump, desempenham um papel importante”, disse Oneglia.
O corte surpreendente dos juros na Noruega ocorreu porque a coroa é uma “moeda de primeira linha” da era da guerra comercial, acrescentou Kit Juckes, chefe de estratégia cambial do Société Générale.
Enquanto isso, com os investidores correndo pelo mundo para identificarem reservas de riqueza que não sejam dólares dos EUA, o franco suíço disparou, reduzindo os custos das importações e empurrando a economia da Suíça para a deflação.
Na quinta-feira, o franco suíço subiu em relação ao dólar, pois os investidores consideraram o corte do SNB muito pequeno para manter a deflação sob controle.
John Stopford, diretor de multiativos da Ninety One, disse que o risco de perigo está aumentando para as bolsas de valores globais e que os produtos de opções que visam a oferecer proteção contra a volatilidade futura parecem razoavelmente baratos.
Stopford disse que está comprando títulos emitidos em países onde a inflação e os juros podem cair substancialmente, como a Nova Zelândia, mas estava negativo em relação aos Treasuries dos EUA de prazos mais longos e aos Bunds alemães, onde a incerteza econômica é maior e os empréstimos governamentais provavelmente aumentarão.
O índice de bolsas de valores globais permanece quase 20% acima de seu ponto mais baixo em abril, depois que os investidores relaxaram em relação às tarifas de importação.
Mas Stopford disse que há mais motivos para preocupação no curto prazo.
“O mercado de ações parece uma casa de palha em um país quente, com risco de incêndio, e as pessoas não estão cobrando muito para fazer o seguro da casa”, acrescentou Stopford.